Ela caminhava durante o corredor de sua casa, observava lentamente os detalhes que lhe incomodava. Não tinha nada para satisfazê-la, deste modo, procurava defeitos em tudo para arranjar distração e esquecer daquilo que lhe tomava por dentro. Nas horas livres - eram sempre livres - tocava seu violão, Let it Be era seu hino e Marlboro, seu vício. Dividia noites, contava sobre seu dia diante de uma garrafa de whiskey. Encontrava-se sozinha e, naquela situação, lembrava de sua vida pacata que não andava nem para frente nem para atrás, havia estacionado... só se enxergava em repouso, como uma resultante nula. De vez em quando procurava fazer coisas diferentes, mas ao cair-se fundo em suas reflexões e perceber a tamanha complexidade que sua vida havia se tornado, voltava à estaca zero, muitas vezes incendiada pelo fogo de seu ódio e rancor que sentia daquela situação. Era notável o grau em que aquela moça se encontrava. Sentava em sua cama e de lá só saía para buscar mais garrafas e maços de Marlboro, lia romances policiais e imaginava quando seria o dia em que o herói, fruto de imaginações lhe salvaria daquele rebuliço, daquela escuridão que a impedia de sair daquela casa, daquele quarto. Eram só os livros que tinham o poder de arrancar um sorriso desta moça, um sorriso esperançoso, como uma parábola gigante. Ela caminhava durante o corredor de sua casa, desta vez, esperando esse dia chegar, enquanto não vinha, ela se encontrava ali... misteriosamente vazia, sem solução e rumo. Era uma rosa cheia de cravos, mas cravos que faziam com que suas pétalas dissolvessem cada dia mais, cada vez mais rápido, torturando-a todo santo dia.