segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

vórtex



[prelúdio. ato i]
silêncio
mar de veneno
mãe do sossego
abrigo sereno
de mentes
conturbadas
pôr do sol laranja
sol quente 
suor carregado
entro no mar na beleza
da inconstância 
as ondas me levam para
caminhos longe da minha direção inicial
me projeto na sombra do sol
a minha sombra é diferente do que sou
a beleza do mar é incoerente?
me salga a pele
foi isso que tirou a minha escama?
é como se eu me visse nua em uma 
praia paradisíaca 
o sol entope as minhas veias de ardência 
sinto como se eu tivesse cheia de malícia
mas vazia de eutimia
me pergunto como o mar é intenso e calmo
como pode ser os dois?
é imenso
é subterrâneo 
não conseguimos ver quase nada a olho nu
o que será que vemos?
o que estamos dispostos a ver?
a sentir?
fecho os olhos e enxergo vermelho 
o resto do sol do pôr do sol
em um misto com o meu sangue ocular pulsante
emudece o meu suor 
que se mistura com a água salgada do mar
e retifica o que eu já sei
somos um só
somos um espelho
.é por isso que eu me incomodo tanto.
silêncio
da calmaria à vórtice complexa
é como eu me sinto
é como eu viajo
para longe
para a imensidão que nem existe a olho nu
é tamanha a correria
a gente nem olha mais pro céu a noite
eu já nem sei viver mais sem correr...
.
pingo o colírio incolor
me rasgo inteira
me abro por completo
me canibalizo
passo a língua nas minhas feridas ásperas
sugo o meu próprio sangue
como se fossem gotas sagradas de profecia
sangue quente
sangue de cor escura carregado de desejo carnal
eu já me torno irracional
imersa involuntariamente pelo profano
amalgamada sob um olhar angelical
de pureza branda
eu me vejo na extensão do meu enlace 
físico-emocional 
é nesta noite que cometo um crime 
contra mim mesma
eu me devoro
em palavras de natureza egocêntrica:
eu me consumo.
esse jardim vira um pântano 
eu me animalizo ferozmente 
sendo uma arlequina sedada de soro venenoso
heterodoxa
de intuição aguçada
selvagem em meu trato real
direto do Templo de Uppsala
louvo a melodia das flautas o meu sacrifício 
sou um estudo antropológico 
do ser irreal magnético 
eu ouço cantarem em meus tímpanos 
o som dos deuses e do diávolos
me jogo pra dentro da floresta e lá permaneço
sangro junto com a natureza 
a terra molhada cura o meu aspecto ríspido
eu vejo o fogo
a minha íris parece derreter pela quantidade de cintilância
se mistura com a minha retina
eu estou na calmaria
parece ser agressivo
mas sou um animal pedante e doutoral
que busca ser sempre o ser e o não ser
mas que se contradiz em seu aspecto donzel
e virginal
a estética se pressupõe do fundamento
eu sou a arte mundana
feroz e visceral
eu louvo o noturno e com ele seus pecados 
eu estou no plano astral inconstante
desregulada de frequência 
sob um êxtase de experiência mística
eu transcendo o meu real símbolo
a minha moral é exílio
e eu me entrego ao gozo carnal
em mente concebo meus pensamentos
e peço perdão...
....que Dieu m’en garde
que assim seja,
assim será.